Uma das maiores empresas de navegação no
segmento de navios multipropósito - que combinam o transporte de veículos,
cargas gerais e contêineres -, o armador italiano Grimaldi está mudando o
comando no Brasil e se prepara para investir em terra. A empresa, dona de uma
frota de 102 embarcações, estuda entrar na operação de terminais portuários,
nicho em que já atua lá fora geralmente em parceria com operadores portuários -
modelo que deve repetir no Brasil.
O interesse recai sobre as duas áreas para
terminais multipropósito do programa federal de arrendamentos: uma no porto de
Santos (SP) e outra no de Suape (PE). "Suape
já tem uma infraestrutura enorme", diz o principal diretor da Grimaldi
no Brasil, Helder Malaguerra, que deixa o cargo no fim de 2015, após 30 anos na
empresa. Em seu lugar tocarão a subsidiária brasileira Miguel Malaguerra e
Gilberto Mazzetto, executivos na companhia.
Os lotes em Santos e Suape integram o
pacote de 90 áreas em portos públicos a serem arrendadas à iniciativa privada
até o fim de 2016. Mas os editais ainda não foram lançados.
Hoje a atuação da Grimaldi no Brasil
limita-se ao transporte com seis navios dedicados a cobrir os tráfegos de longo
curso. As embarcações escalam a cada dez dias os portos de Santos, Vitória
(ES), Rio de Janeiro (RJ) e Paranaguá (PR).
Segundo Miguel, a parte portuária é "tanto a oportunidade como o fator de
limitação" da Grimaldi no país. No primeiro caso encaixam-se os
futuros terminais; no segundo, as restrições à vinda dos navios mais modernos
devido às dimensões dos canais de navegação de alguns portos. O problema é a
largura, não o calado (os navios da empresa têm calado na faixa de 10 metros).
As embarcações mais novas da Grimaldi têm 36,4 metros de largura e não entram
no porto de Vitória, onde o máximo permitido são 32 metros. "Vitória é um porto importante, há toda uma
logística montada", diz.
De acordo com o executivo, seria ideal que
esses navios escalassem o Brasil, pois, em relação à frota antiga, eles tiveram
um aumento pequeno de tonelagem bruta e um ganho exponencial na capacidade de
transporte, especialmente para contêineres - de 800 para 1.400 contêineres.
"A nossa fatia no mercado de
contêiner tem aumentado devido à demanda e esses navios são mais adequados ao
mix atual das cargas", diz Miguel.
Gilberto Mazzetto diz que um dos desafios
da empresa em 2016 é "continuar se
reinventando". "Será um ano
difícil tanto em relação a faturamento quanto a margens [de lucro]".
Há 20 anos na Grimaldi, Mazzetto acompanha
a mudança da matriz de carregamento dos navios, com aumento da fatia de
contêineres sobre carga geral e veículos, fruto do processo mundial de
conteinerização. Contudo, esse movimento não ameaça a escolha que a empresa fez
lá atrás de ser um armador multipropósito em vez de apostar todas as fichas no
transporte de contêineres - indústria que enfrenta sobra de capacidade e nova
onda de consolidação.
O convés multiuso permite à empresa
balancear o mix de carregamento conforme oscila o mercado de cada carga. "Muitos armadores desapareceram nos últimos
30 anos. A Grimaldi, corretamente, dirigiu o foco para nichos e hoje somos um
dos maiores no setor ro-ro [cargas rolantes]", diz Helder.
De capital fechado e 100% familiar, a
Grimaldi surgiu em 1943 na esteira da reconstrução da Itália após a queda do
ditador Mussolini. A empresa não divulga faturamento, mas afirma que os navios
no Brasil têm operado com ocupação entre 80% e 90%. Nos últimos anos, contudo,
retirou capacidade dos tráfegos com o Brasil. Há seis anos chegou a ter, por
curtos períodos, 15 embarcações dedicadas às rotas brasileiras. Em 2013 eram
sete e desde 2014 são seis.
Em meio à crise brasileira, uma das
perspectivas positivas vem da Argentina, com o novo governo. "Nos últimos anos as barreiras indiretas
resultaram em queda significativa. No passado a média de troca entre os dois
países era de 800 mil veículos por ano. Nos últimos anos está abaixo de 500 mil",
diz Miguel. Há três anos a Grimaldi encerrou o serviço de navegação dedicado entre
os dois países.
Além do setor automotivo a Grimaldi está
atenta a investimentos em infraestrutura na Argentina que demandarão transporte
de grandes peças. "A Argentina terá
de renovar seu parque industrial. E esse é um tipo de carga importante para nós,
que tira um pouco do peso da nossa dependência do contêiner", diz
Mazzetto.
Fonte: Valor Econômico/Fernanda Pires | De
São Paulo